Conta Notarial e a nova função fiduciária do Tabelião de Notas

27 de agosto de 2025 Por Alice Ferreira de Azevedo

Celebrar negócios jurídicos no Brasil pode gerar uma desconfiança quanto ao cumprimento das obrigações entre as partes, mesmo quando o negócio é formalizado por escrito ou até mesmo por instrumento público. A Escrow Account é uma ferramenta especialmente utilizada em operações complexas, com valores elevados e alto risco, oferecida por instituições financeiras, que funciona como uma conta de depósito para garantir o cumprimento de todas as obrigações envolvendo o negócio jurídico celebrado.

Tendo em vista a necessidade de ampliar estes serviços que tem o objetivo de resguardar os interesses das partes durante a execução de um negócio jurídico, a Lei nº 14.711/2023 – Novo Marco Legal das Garantias – trouxe a possibilidade da abertura de conta bancária administrada pelo Tabelião de Notas. Essa nova modalidade foi incorporada ao ordenamento jurídico por meio da inclusão do §1º no art. 7º-A da Lei nº 8.935/1994, e em 13/06/2025 o Conselho Nacional de Justiça editou o Provimento nº 197 regulamentando o serviço da denominada conta notarial.

A conta notarial funciona como uma conta bancária para depósito de valores, administrada por terceiro imparcial até que sejam concluídas as condições expressamente pactuadas pelas partes. Este novo serviço incorpora uma função fiduciária ao Tabelião de Notas, que atuará como agente garantidor em operações como compra e venda de imóveis, parcerias para desenvolvimento de negócios, veículos, maquinário agrícola, inventários, entre outros.

Importante destacar que o §2° do art. 7°-A da Lei 8.935/1994 garante a segregação patrimonial e impenhorabilidade da conta notarial. A segregação patrimonial consiste no isolamento dos valores depositados na conta, desvinculando-os do patrimônio do cartório, das partes e de eventuais credores. Já a impenhorabilidade significa que os valores transferidos para a conta notarial não podem sofrer penhora judicial ou fiscal em razão de dívidas do depositante, das partes ou do próprio Tabelião, salvo se os débitos tiverem relação direta com o negócio.

Especificamente sobre o Provimento nº 197 é importante entender a definição de estrutura, critérios, procedimento, responsabilidade e sigilo que envolvem o serviço.

A estrutura do serviço da conta notarial envolve as funções do notário. Ao indicar que o Tabelião irá receber e administrar os valores, significa que atuará como depositário dos montantes envolvidos no negócio jurídico, ou seja, será responsável pela gestão temporária do patrimônio privado. A função de verificar e depositar os valores revela uma obrigação de análise imparcial das condições do negócio jurídico, certificando-se de que a operação foi concluída.

Quanto ao procedimento, o serviço da conta notarial será solicitado pelas partes envolvidas no negócio mediante requerimento e iniciado com a anuência aos termos e condições. O Oficial deverá realizar consultas a certidões negativas ou positivas com efeito de negativa de débitos fiscais e certidões de distribuições forenses, advertindo as partes sobre eventuais riscos ao negócio.

A pedido das partes o Tabelião irá documentar formalmente, por meio de ata notarial, se houve ou não a conclusão do negócio, explicitando os motivos principalmente em caso de divergência entre as partes. Conforme parágrafo único do art. 10, essa ata pode servir como título apto a registro, nos termos do art. 221 da Lei nº 6.015/1973 – Lei de Registros Públicos.

O serviço da conta notarial funcionará por meio de convênio com instituições financeiras, sendo que o Colégio Notarial do Brasil (CNB) já firmou parceria com o Banco Safra. O art. 11 do Provimento nº 197 estabelece que a remuneração do Tabelião será feita pelo próprio Banco e veda o repasse de “custos adicionais” ao usuário, devendo ser pago apenas as taxas fixas a instituição financeira.

Importante esclarecer que o Tabelião não decidirá sobre a eficácia ou rescisão do negócio jurídico, limitando-se a documentar os fatos verificados. O art. 12 do Provimento impõe expressamente a responsabilidade civil, administrativa e criminal do notário pelos atos praticados na gestão da conta, conforme a Lei nº 8.935/1994.

Por fim, o Provimento dispõe expressamente que, nos casos em que o negócio contiver cláusula de confidencialidade, o Tabelião manterá sigilo sobre os termos contratuais. Os documentos relacionados ao serviço de conta notarial poderão ser acessados apenas para fins correcionais ou mediante determinação judicial.

Dessa forma, a criação da conta notarial representa um avanço expressivo para o ambiente de negócios no Brasil. Ao permitir que o notário atue como depositário imparcial, o instituto contribui para maior segurança, previsibilidade e confiança nas transações, especialmente naquelas que envolvem condição suspensiva, múltiplas partes ou pagamentos variáveis e escalonados. Com a gestão da conta sob responsabilidade de profissional dotado de fé pública e qualificação técnica, fortalece-se a estabilidade das relações jurídicas e a efetividade dos acordos celebrados.

A equipe de Direito Imobiliário do Goulart Colepicolo Advogados está à disposição para oferecer suporte jurídico especializado às operações que utilizarem a conta notarial.

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